30 de maio de 2014

A Tenda Vermelha - Anita Diamant

Na Biblía, Dinah é a única filha de Jacó, nascida de sua união com sua primeira esposa, Lia. Na Bíblia, Dinah aparece no Gênesis, 34 E saiu Diná, filha de Lia, que esta dera a Jacó, para ver as filhas da terra. E Siquém, filho de Hamor, heveu, príncipe daquela terra, viu-a, e tomou-a, e deitou-se com ela, e humilhou-a. E apegou-se a sua alma com Diná, filha de Jacó, e amou a moça e falou afetuosamente à moça. ”



Porém, em A Tenda Vermelha, Anita Diamant dá voz as mudas mulheres da Bíblia, expressando seus sentimentos, desejos, aflições e conhecimentos sobre a vida e a morte. A história começa quando a jovem Raquel conhece seu primo, Jacó, à beira de um poço e os dois se apaixonam. O pai de Raquel, Labão, não aceita que a filha mais nova se case, e depois de algum tempo, Jacó casa-se com a filha mais velha de Labão, Lia, irmã de Raquel. (Até ai, a história é idêntica àquela contada no livro sagrado).

Jacó ainda casa-se com outras duas mulheres, irmãs ilegítimas de Raquel e Lia, Bilah e Zilpah. A primeira parte do livro se debruça sobre essas quatro mulheres, tão diferentes entre si e todas habitantes do mesmo espaço. Lia é a mulher forte e decidida, que mantém toda a família unida e funcionando. Raquel é a força amável e bela e que se torna a parteira e curandeira da aldeia. Zilpah é a guardiã da força religiosa feminina e Bilah é a força aplacadora e equilibrada.


A cada lua nova, todas as mulheres se reúnem na Tenda Vermelha, onde passam três dias e três noites em repouso absoluto durante o período da menstruação. Esse é o único momento em que as mulheres não têm afazeres domésticos e podem dedicar-se somente a si a seus filhos pequenos. É na Tenda também que são trocados segredos, confissões e experiências do mundo das mulheres. E é nesse ambiente que nasce e cresce Dinah.


A segunda parte do livro é narrada pela própria Dinah, contando sua infância, a longa jornada até Canaã, a descoberta do amor com o príncipe Shalem e a dor de ser mulher em um mundo que as ignora.


Mais do que um belíssimo romance bíblico, A Tenda Vermelha narra a história de incríveis mulheres, que mesmo tendo existido tantos séculos atrás, ainda têm muito a nos dizer. A narrativa de Diamant é delicada e apaixonante, além de um relato histórico extremamente bem feito.
 






Esse livro chegou em minhas mãos quando eu tinha 16 anos. Ele era de uma outra pessoa, mas parece que o destino o enviou pra mim. Me apaixonei tanto pela história que essa pessoa, que havia ganhado o livro de presente de um amigo, resolveu dá-lo para mim. 

Agora eu o reli aos 24 anos. As impressões quanto a qualidade é a mesma, mas as percepções são outras. Esse é um livro que não se esgota. Fala com todas as meninas, moças, mulheres, de qualquer idade, de qualquer tempo.

25 de maio de 2014

Erros Fantásticos: O Discurso “Faça Boa Arte”, de Neil Gaiman




Em maio de 2012 o (incrível) escritor, roteirista e quadrinista Neil Gaiman foi convidado para discursar na University of the Arts, na Filadélfia, EUA. Seu discurso acabou sendo intitulado “Faça Boa Arte”, e em conjunto com o designer gráfico Chip Kidd, foi transformado em um livro encantador.

Gaiman começa nos contando como, aos 15 anos de idade, fez uma lista de coisas que queria fazer na vida, e que desde então perseguiu: Escrever um romance, um quadrinho, um episódio de Doctor Who… E a cada item ‘alcançado’, ele se movia para o próximo.

Seu discurso é uma verdadeira declaração de amor à arte e a todos aqueles que têm a coragem de fazê-la, seja em seus melhores ou piores momentos. Toda e qualquer situação é motivo para que se faça boa arte.
O escritor admite que haverá momentos em que se terá de aceitar trabalhos só pelo dinheiro para se alimentar, pagar o aluguel e outras banalidades da vida, mas que também haverá o momento de colher os frutos de seu trabalho, e, repassando o concelho de Stephan King (que Gaiman não conseguiu seguir), aproveite!

Se tem um lugar para deixar esse pequeno livro, é do lado da cabeceira, dentro da bolsa, ao lado do computador em que trabalhamos, pois com certeza ele será sempre uma fonte de inspiração e força. Quando você não achar que é capaz, ou que não é bom o suficiente, ou pensar em desistir de seus sonhos, abra as páginas desse discurso. Há algum lugar ele te levará.




A edição brasileira, publicada pela Intrínseca, é muito caprichada. A capa é dura e com textura emborrachada, e o miolo é de uma gramatura mais alta, e as páginas são coloridas. Chip Kidd diagramou o livro de maneira tal que o conteúdo do texto dialogasse com o espaço da página. É definitivamente Boa Arte.





 

13 de maio de 2014

O Segredo do meu Marido – Liane Moriarty



Cecilia é casada com John Paul há anos. Sua vida parece perfeita. Mãe exemplar. Esposa exemplar. Dona de casa exemplar. Para toda a comunidade cristã de Sidney da qual faz parte é uma mulher modelo de conduta e organização. Tudo em seu dia a dia é exatamente do jeito que ela gostaria que fosse. Até o Muro de Berlim.

Sua filha do meio, Esther, está obcecada com o Muro, e Cecilia vai até o seu (exageradamente) organizado sótão para pegar seu ‘pedaço do Muro de Berlim’, que trouxera como souvenir de uma viagem à Alemanha. Porém, uma das caixas de contas arquivadas de seu marido cai, e ao tentar arrumar a bagunça, Cecilia encontra uma carta endereçada a ela: Para minha esposa, Cecilia Fitzpatrick. Para ser aberta apenas na ocasião da minha morte.

Tessa é uma mulher calada e centrada, mas que esconde uma grande ansiedade social. Seu refúgio é o casamento tranquilo com Will e sua melhor amiga - irmã, colega de trabalho, e prima Felicity, além do filho Liam, de seis anos. Mas todo esse mundo confortável vem a baixo quando Will e Felicity revelam que estão apaixonados.

Rachel é uma mulher idosa e viúva. Sua única fonte de alegria é seu neto Jacob, de cerca de um ano, mas que logo vai se mudar para Nova York com seus pais. Por mais que tente levar uma vida normal, Rachel é assombrada pelo inexplicável assassinato de sua filha adolescente, Janie, cerca de 20 anos atrás. A garota foi encontrada morta em um parque da cidade, com um rosário na mão. O legista indicou como causa da morte estrangulamento.

A história por trás de “O Segredo do meu Marido’, da Australiana Liane Moriarty, gira em torno dessas três mulheres, de suas vidas, famílias, e a comunidade cristã da qual fazem parte. O destino de todos os personagens está intimamente conectado, e de maneira surpreendente.

A narrativa em terceira pessoa coloca o leitor dentro dos pensamentos e divagações de cada uma das três ‘protagonistas’, nos fazendo sentir antipatia, empatia, raiva ou solidariedade por cada uma delas. Mas o livro não se restringe ao mundo feminino, sendo os personagens masculinos tão, ou mais, interessantes.

É impossível definir o que exatamente a história transmite. Todos os sentimentos humanos, dos mais nobres aos mais mesquinhos, permeiam a vida dos personagens, além de propor ao leitor reflexões importantes sobre a vida e nossas relações com o próximo, seja ele cônjuge, amigo, ou apenas um conhecido. É impossível também não refletir sobre nossas vidas e os muitos caminhos que ela pode tomar, a cada escolha, a cada mínimo ato que realizamos.


Li todo o livro em dois dias. Não consegui simplesmente fechá-lo e parar de pensar nas histórias daqueles pessoas comuns, com dilemas comuns. Antes de eu ler, minha mãe leu o livro, e adorou. Sinto que daqui há alguns ou muitos anos terei de ler ‘O Segredo do meu Marido’ mais uma vez e me perguntar: O que você acha de tudo isso agora?



Esse livro foi cortesia da Editora Intrínseca. Quem ai já leu? E quem pretende ler?

5 de maio de 2014

Admirável Mundo Novo - Aldous Huxley

Em 1932 o inglês Aldous Huxley publicou ‘Admirável Mundo Novo’, que retrata um mundo futurístico e distópico. Nesse mundo não existe tristeza, todas as pessoas são felizes. Mas também não existem pais e mães, porque as crianças nascem e são criadas em laboratório, não existe família ou relacionamentos amorosos. As pessoas são divididas em castas, sendo os Alfa os mais inteligentes e poderosos e os ípsilons os trabalhadores braçais e pobres.

 Se tudo isso já não fosse bastante assustador, também não existe religião, doença ou velhice. A sociedade é completamente artificial e imediatista. Nada é renovável e é ‘lei’ que tudo o que as pessoas usem seja um bem de consumo, de preferência de pouca duração. É preciso manter a economia ativa. Sua roupa rasgou? Jogue fora e compre outra! E se a infelicidade te rondar, há o Soma, uma droga distribuída pelo governo e que não tem efeitos colaterais como as drogas anteriores dos homens não civilizados (álcool, cocaína, etc).

Todas as pessoas pensam do mesmo jeito e estão satisfeitas com sua condição graças a um sistema de condicionamento (inspirado em Pavlov). Como as crianças nascem em laboratórios, elas são submetidas a gravações com frases de efeito, simples e de fácil memorização, durante toda a infância enquanto dormem. Assim como todas as vezes que pegam em livros, tomam choque, e no hospital, ao encarar a morte, ganham chocolates. Logo, a morte é algo natural e legal, livros são perigosos, assim como a natureza (porque natureza é de graça, não existe lucro em admirar a natureza).

Os primeiros capítulos nos apresentam todos os métodos de concepção em laboratório, padronização e condicionamento. Logo o leitor conhece Bernard Marx, um Alfa que trabalha como cientista mas tem ideias um pouco controversas. Ele acha horrível que os homens falem das mulheres como um pedaço de carne, assim como tem vontade de manter relações amorosas com uma única mulher, Lenina, que é completamente normal e igual a todo mundo.

Bernard e Lenina vão passar suas férias no Novo México, em uma reserva de ‘selvagens’, ou seja, pessoas que não se submeteram ao novo regime mundial e nem ao novo conceito de civilidade. Esses selvagens na verdade são bem parecidos com os índios norte-americanos, vivem sem nenhum tipo de tecnologia ou contato com o mundo ‘civilizado’ e seguem costumes religiosos, que mistura Cristo com os deuses pagãos.

Em meio aos selvagens Bernard encontra Linda, uma mulher na casa dos 40 anos, que costumava pertencer ao mundo ‘de fora’, mas se perdeu nas montanhas e se feriu na cabeça. Os selvagens a acharam e desde então ela vive na reserva. Porém, quando foi resgatada Linda estava grávida e acabou dando à luz a John, um garoto branco e loiro, que por esse motivo é rejeitado pela comunidade. Sua mãe, seguindo o costume da civilização, se deita com todos os homens que a procuram porque ‘Todos pertencem a todos’ e por esse motivo também é rejeitada pelas outras mulheres da reserva.

Linda e John voltam para a Londres com Bernard e Lenina. Linda, velha, doente e mãe, é rejeitada por todos, enquanto John passa a ser conhecido como Sr. Selvagem e ganha destaque na civilização, pois todos querem conhece-lo e ouvir sobre seus estranhos hábitos e crenças. 


Na época de sua publicação ‘Admirável Mundo Novo’ foi um tapa na cara de toda a sociedade, pois, apesar de assustador, o futuro previsto por Huxley não parecia distante nem impossível. O povo civilizado não acredita e nem sabe o que é Deus, mas usa a expressão “Oh meu Ford!” uma clara referência a Henry Ford, responsável pela criação e popularização da produção em massa e padronização da produção.

Na mesma época em que o livro foi escrito, o mundo começou a perceber um levante de movimentos ultra nacionalistas e de regimes totalitários, que resultariam na Segunda Guerra Mundial. Os Estados Unidos se recuperava da Grande Depressão com o pacto econômico do New Deal, com o Estado intervindo na economia.


Uma das frases mais ditas em relação à 'Admirável Mundo Novo' é como o livro continua atual, continua falando muito à nossa sociedade. Concordo, mas em partes. É verdade que somos ainda mais imediatistas e que continuamos consumindo muito e de uma maneira padronizada. Mas também vejo um movimento de reaproximação com a natureza e dos valores de família e espiritualidade. Porém, vigiai. 

Bônus (para reflexão):


"Povo marcado, povo feliz"