28 de março de 2014

O Cemitério dos Livros Esquecidos

Muito provavelmente, não fossem os meus colegas e amigos booktubers, nunca teria entrado em contato com a obra do espanhol Carlos Ruiz Zafón. Pois foi só depois de ouvir tantas criticas positivas a sua obra que comprei os três livros da série ‘O Cemitério dos Livros Esquecidos’.


O primeiro deles é ‘A Sombra do Vento’, que vendeu mais de 6,5 milhões de cópias em todo o mundo. A história tem início na Barcelona dos anos 40 em pleno regime franquista, quando o menino Daniel Sempere, orfão de mãe, acorda gritando em uma madrugada e seu pai, dono da livraria Sempere e Filho, então decide revelá-lo um grande segredo.

Pai e filho vão parar na porta de um local um tanto sombrio, que no fim se revela um imenso labirinto de estantes e mais estantes forradas de livros. Esse é o Cemitério dos Livros Esquecidos, e a partir do momento em que alguém conhece esse local tem de escolher um livro de lá e jurar protegê-lo para o resto de sua vida.

Daniel escolhe um livro chamado ‘A Sombra do Vento’, escrito por Julián Carax e passa dias intoxicado com a prosa do escritor, mas descobre que quase ninguém o conhece e que praticamente todas as suas obras foram destruídas em um incêndio. As obras restantes são vendidas a preço de ouro, mas há um homem que as compra para queimá-las. E Carax, que viveu por anos na França, foi morto ao voltar para a Espanha, em meio a Guerra Civil.

A partir desse momento Daniel dedica-se a descobrir o que mais puder sobre o escritor e desvendar seus mistérios, ao mesmo tempo em que tenta desvendar os mistérios de sua própria vida, passando da adolescência para a idade adulta, descobrindo o verdadeiro amor e a verdadeira dor da perda.

A escrita de Zafón é carregada de poesia e sentimentos profundos. É impossível não se emocionar ou se colocar na pele dos personagens. Sentimos  as cores e os sabores de uma Barcelona sombria, sempre lidando com o perigo à espreita. Impossível também não se apegar aos personagens. O puro e bondoso Daniel, seu engraçado e sarcástico amigo Fermín e a misteriosa Bea Aguilar.


O segundo volume da série é ‘O Jogo do Anjo’, não é uma continuação de ‘A Sombra do Vento’ e sim é um ‘prequel’ que não parece um, sejamos sinceros. O livro nos apresenta o jovem David Martín, que foi criado na gráfica e redação de um jornal de Barcelona desde que ficou orfão aos 7 anos de idade. David tem um imenso talento para a escrita, e em 1917 começa a publicar no jornal uma história de crime e mistério intitulada “A Cidade dos Malditos’.

Com o tempo David se torna um escritor melhor sucedido, e vai viver em um belo (e assustador) casarão, onde passa dias e madrugadas trancado escrevendo. O escritor tem poucos amigos, mas um deles é o Sr. Sempere (avô de Daniel), dono da livraria Semprere e Filho, e outra é Isabella, filha do dono da venda, que decide ser sua ‘pupila’, mesmo contra a vontade de David.

O Jogo do Anjo dialoga em vários momentos com o primeiro livro da série, inclusive tendo algumas cenas passadas no cemitério dos livros esquecidos. Porém o elemento fantástico e sombrio está muito mais presente nesse livro do que no primeiro, e muitas coisas ficam vagas, cabendo ao leitor interpretá-las.



O terceiro livro, ‘O Prisioneiro do Céu’, tem início em 1957 e é uma continuação do primeiro volume, sendo narrado por um Daniel mais velho, já pai. Boa parte do romance é dedicado a contar a história de Fermín, desde que este foi preso pelo governo no Castelo de Montjuic, até tornar-se mendigo e por fim ser acolhido pela família Sempere.

Enquanto os outros dois livros traziam muitos elementos sobrenaturais, este trata da violência e sofrimentos do mundo real, principalmente dos presos políticos e dos pobres ignorados pelo novo regime.

Mas, por se tratar de Zafón, há sempre surpresas. As histórias dos três livros começam a se entrelaçar e os elementos fantásticos voltam à cena. O final é inconclusivo e o autor está trabalhando no que deve ser o último volume da série.





Sobre o autor

Carlos Ruiz Zafón nasceu em 1964 em Barcelona, Catalunha, Espanha e desde 1993 mora em Los Angeles, onde trabalhou com roteiros para cinema e tv. Hoje dedica-se só a escrever romances, mas também escreve para dois jornais espanhóis – La Vanguardia e El País.


Me chama a atenção o fato de o autor viver a tantos anos longe de Barcelona e mesmo assim ambientar suas obras nessa cidade tão poderosa. É possível perceber, através de sua obra, a forte ligação entre o autor e sua terra natal. Uma cidade misteriosa e envolvente.







No YouTube:







17 de março de 2014

Como 'Gravidade' não é um filme sobre o espaço

Quando Gravidade (Gravity) foi para os cinemas do Brasil, causando todo aquele falatório sobre o novo longa de Afonso Cuarón, fui correndo assistir ao trailer. E naõ foi surpresa nenhuma para mim que logo de cara eu dissesse: ‘Eu filme não é para mim’. Não sou fã de filmes que se passam no espaço, por nenhum motivo real, apenas não me interesso. Mas o que realmente me fez dizer não à Gravidade foi o fato da personagem principal passar boa parte do tempo lutando para respirar.

Como alguém que tem pavor de lugares fechados e coisas do tipo, só de ver ao trailer comecei a ficar com aflição, como se a falta de ar fosse minha. Passado meses do filme ter estreiado, e após ganhar 7 estatuetas do Oscar, resolvi ver o filme junto com meu padrasto e a minha mãe, em casa.

O filme conta a história da Dra. Ryan Stone (Sandra Bullock) , que está em sua primeira missão espacial, com o colega de trabalho Matt Kawalski (George Clooney). A missão é reparar uma base espacil americana e voltar para a Terra. Coisa simples de rotina (para a Nasa, pelo menos).

A problemática começa quando um satélite russo explode e os estilhaços estão à deriva pelo espaço e atingem a base espacil americana, matando a tripulação. Quem fica à deriva no espaço então são Ryan e Matt, lutando para sobreviver e voltar para casa.

Até ai, ok. Nada que me fizesse escrever um post aqui por blog. Porém, depois que já enjoamos de ver os efeitos especiais e tudo de ruim que pode acontecer com a Dra. Ryan, a verdadeira história começa. E foi ai que percebi que Gravidade não é um filme sobre o espaço. Gravidade é um filme que conta a história de uma mãe que perdeu sua filinha e com ela sua vontade de viver e sua fé.

A medida que a Dra. Ross passa por experiências traumáticas, ela redescobre que vale a pena viver e recupera sua fé, em si mesma e em Deus. E não, não estou viajando. Isso fica claro quando na ‘nave’ russa há um close em um santo da igreja ortodóxica católica,, e na ‘nave’ chinesa há um close em um pequeno Buda dourado. Há outras referências, não só espirituais, mas também a cultura pop e outras teorias que não me interessam.



No fim, Gravidade foi um dos filmes mais tocantes que eu já vi. Mereceu os prêmios que ganhou, e Sandra Bullock mereceria muito mais um Oscar de melhor atriz por essa atuação do que por Um Sonho Possível.

6 de março de 2014

Lolita - Vladimir Nabokov

‘Lolita, luz da minha vida, labareda em minha carne. Minha alma, minha lama’.



Vladimir Nabokov terminou “Lolita” em 1953, após anos lutando com a história, que desde de seu primeiro lampejo, passou por diversas modificações. Após o manuscrito ser recusado por diversas editoras americanas, foi publicado na França em 1955 e em 1958 nos Estados Unidos.

Lolita foi o primeiro romance que o escritor russo escreveu em língua inglesa, depois de ter se exilado na América, fugindo da Rússia socialista. Desde de sua publicação até hoje o livro permanece como um dos mais controversos da história por tratar de um tema delicado e polêmico, a pedofilia.

O livro é um diário escrito na prisão pelo protagonista, o professor de literatura Humbert Humbert, que justifica a existência dos escritos como uma última forma de declaração de amor à Lolita, assim como um registro de suas memórias da garota, pela qual ele desenvolve uma obsessão.

Humbert começa suas memórias na sua terra natal, a França. Órfão de mãe, o garoto foi criado pelo pai em um luxuoso hotel à beira mar. Lá pelos seus 12 anos ele vive sua primeira paixão e sua primeira experiencia sexual, com uma garota da mesma idade, que pouco depois morre.

O protagonista então justifica que desde a perda de sua amada só consegue se interessar por menininhas. Mas não qualquer tipo de menina, e sim aquelas que tem um quê de ninfa, uma sexualidade já latente mesmo na infância. É dai que nasce o termo “ninfeta’.

Após passar algumas temporadas em hospícios, Humbert se muda para os Estados Unidos, e se interessa em alugar um quarto na casa de Charlotte Haze, uma viúva um tanto fútil, mãe de uma garota chamada Dollores, mas a qual todos chamam de Lô ou Dolly. Humbert se apaixona pela garota, e acaba por casar-se com Charlotte só para ficar perto de Lolita (apelido só usado por Humbert).

Enquanto Lolita está passando férias em um acampamento, Charlotte morre e Humbert se torna seu padrasto e os dois desenvolvem um relacionamento doentio, baseado em ameaças, favores sexuais e suborno.

Lolita ganhou o status de clássico graças a prosa de Nabokov. Repleta de cinismo, sarcasmo e sentimentos conflitantes, o autor nos coloca dentro da cabeça e do coração de um homem deprimido e instável, que a todo momento conversa com o leitor, implorando-nos que entendamos os motivos por trás de suas ações.

Até hoje os especialistas em literatura não sabem como classificar Lolita. Romance erótico, novela de costumes, surrealista, modernista, alegoria da velha russa x a nova América… A verdade é que o próprio Nabokov afirma no posfácio “Não escrevo nem leio obras de ficção com fins didáticos (…) Lolita não traz nenhuma moral a reboque”.

Cabe a cada leitor tirar suas próprias conclusões do livro, e mergulhar no lado escuro do ser humano que muitas vezes preferimos fingir que não existe. Humbert é um homem doente, mas Lolita também é uma garota manipuladora e sádica, assim como Charlotte era uma mãe castradora (para usar um termo freudiano).


P.S: Existem duas versões de Lolita para o cinema, ambas muito conhecidas. Assim que assisti-las venho contar para vocês o que achei de cada uma.