23 de junho de 2014

Tempos Extremos - Mírian Leitão


Soledade de Sinhá é uma fazenda perdida no tempo. Incrustrada entre os morros verdes mineiros, sem energia elétrica, três andares, pisos de madeira, janelões azuis. O que hoje é porão abarrotado de móveis velhos era a senzala.

Dona Maria José vai completar 88 anos em um feriado prolongado e convoca filhos, netos e bisnetos para a fazenda. Dias de união em frete a farta mesa, tudo feito no fogão à lenha. São 4 filhos: Hélio, militar aposentado. Sônia, a dona da fazenda, economista bem sucedida, rica mesmo. Alice, militante política de esquerda desde os 18 anos até hoje. Marcos, o caçula sonhador, tocador de violão e sem trabalho fixo.
Quatro irmãos de personalidades tão distintas. Hélio teve dois filhos. Sônia, nunca achou o amor. Marcos têm um casal, ambos cresceram distantes do pai. Alice só tem Larissa. A ‘estranha’, calada e tímida Larissa. Cujo pai ela nunca conheceu, preso pelo Regime Militar, assim como Alice, Carlos entrou no DOI, mas nunca saiu. Não morreu, é ‘desaparecido’ político.

Larissa se formou jornalista, mas um dia não quis mais a pressão da redação e começou uma segunda graduação, em história. E em suas andanças solitárias pelo casarão, seja em meio à luz do dia ou da escuridão total, ela reflete sobre seu futuro, sobre o pai que nunca chegou, sobre os escravos que ali sofreram, sonharam com a liberdade, com um futuro sem segregação.

O século XIX e XXI se envolvem de maneira inesperada, criando duas linhas narrativas complementares. Dois tempos extremos, muitas dúvidas, muitas paixões, muitas brigas ganhadas e muitas perdidas. As feridas do Brasil escravocrata e do Brasil do Regime Militar são sempre expostas, estão sempre sangrando, inquietas, buscando respostas.
A narrativa de Mírian é arrastada, como a fala do mineiro, dando espaço aos sentimentos, as interpretações. Muitas ideias são repetidas muitas vezes, extenuantes. Outras ficam implícitas, deixadas a cargo do leitor descobri-las e entende-las a sua maneira.

As falas dos personagens muitas vezes lembram os diálogos do teatro. Longos, explicativos, pomposos. Não à toa a tragédia grega Antígona, de Sófocles, permeia a obra.



Minhas Impressões:

Desde o começo esse livro me pegou pelas memórias, pelos sentimentos compartilhados. A fazenda, o mato, o café coado, o pão de queijo, as mesas fartas. Sentia os cheiros, os gostos. Meu avô materno era mineiro e a mineirice é patrimônio da família.

Mas meu avô também era do partido comunista nos tempos da Ditadura. Quase foi preso, integrou movimentos de resistência. Morreu acreditando que nosso país ainda tinha jeito.

Durante a leitura as descrições dos locais me fascinaram e me fizeram sentir saudades. As injustiças me deixaram agoniada, com uma raiva que só sentem os impotentes diante do que nada se pode fazer. Meu único problema foi que ás vezes os personagens se tornavam muito repetitivos. De resto, o livro é excelente.


Mixtape 

Todo o livro é permeado por referências à músicas brasileiras, algumas antigas, outras mais novas e uma única música internacional, de Nina Simone. Como as músicas são todas muito lindas, resolvi criar um mixtape no 8tracks com todas elas para vocês :)


5 comentários:

  1. Quantas fotos lindas Sté. Como estou corrida pra comentar no youtube, vou comentar aqui (:

    tenho problemas com literatura nacional, acho que li muitos na adolescência e agora não consigo me interessar. Mas Achei lindo o livro (a capa).

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  2. O livro parece ser interessante, adoro essas dicas pq amo ler! Flor, gostei do seu blog e já to seguindo, se puder me segue tb, bjus!
    talkingabout-reb.blogspot.com

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  3. Oi! Tudo bom?
    Parece ser uma leitura bem intensa, e nada mediana. Os últimos livros que tenho lido são bem água com açúcar, com raríssimas exceções. O tema retratado é bem impactante, nunca li nada parecido, não que eu lembre. Gostei bastante da resenha, muito bem escrita. Parabéns!

    http://www.vivapaulatinamente.com/

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  4. Gosta de livros acesse: www.sonhandopaginas.blogspot.com.

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  5. Que fotos lindas ilustrando a resenha *-*'
    Eu não consigo pensar nessa época da ditadura militar sem sentir um aperto no peito, apesar de não ter estado lá, vejo o retrogresso que isso trouxe à nossa nação, as atrocidades cometidas, foi um absurdo e ter uma história dentro de tudo isso deve ser um desafio mesmo. Já tinha visto a capa, mas nunca me interessara. Gosto muito de livros que entrelaçam histórias de personagens e tempos passados. Acho que eu gostaria da leitura.

    Beijo,
    Mari Siqueira
    http://loveloversblog.blogspot.com

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